segunda-feira, 16 de setembro de 2013

manifestações de junho: saiu o sujeito, ficou só a máscara

Talvez demore para a gente ver outro fenômeno como o que aconteceu em junho deste ano: as famosas manifestações pelas ruas, o tal gigante despertado, enfim, um acontecimento muito inusitado em termos políticos.
            E não demorou para que muitos, inclusive eu, começasse a fazer comparações entre essas manifestações e outros movimentos como o “Diretas Já” e o “Fora Collor”. Acho que nos equivocamos... Porque o “Diretas Já”, embora tenha fracassado, tinha um foco (palavrinha banalizada hoje em dia...), já o “Fora Collor”, além de ter um foco, surtiu o efeito desejado.  Nos dois casos o que estava claro era a ambientação política, o clima de decisão, o momento de efervescência nos noticiários. No caso do... não sei que título dar ao movimento de junho... Bom, chamar-lhe-ei “Movimento Passe Livre”, porque foi assim que tudo começou.
            O movimento, que começou reivindicando transporte coletivo gratuito ou a preços mais baixos,  ganhou proporções de protesto contra tudo e contra todos, contra todos os partidos, contra o governo federal, contra os governadores, contra o Congresso,  contra deus e o demônio, contra gregos e troianos, contra, contra, contra. Sim, houve gritos a favor... a favor da educação, da saúde, do fim da corrupção, assim como fazem todos os partidos em época de campanha eleitoral. 
Em meio à empolgação com a adesão gigante, a razão perdeu o controle do jogo do poder e a imprensa também virou alvo do coro de protestos. Foi aí que os discípulos de Maquiavel balançaram a cabeça e lamentaram: “vai dar merda”. E deu. Ao terem seus carros incendiados e suas equipes hostilizadas, a grande mídia, discretamente, retirou seus holofotes dos manifestantes com bandeiras em punho e os lançou sobre os vândalos, cuja ação também saiu do controle do “Passe Livre”.
            Pela palavra da grande imprensa os vândalos foram ganhando cada vez mais espaço de tempo nos noticiários até se tornarem os verdadeiros sujeitos da coisa toda. O Gigante perdeu a voz, perdeu a postura, perdeu a credibilidade, se perdeu... Os que eram denominados vândalos talvez se sentissem surpresos com uma exposição tão grande e trataram de se proteger: adotaram as máscaras. Debaixo de máscaras os envolvidos se confundiram. A essa altura já não se sabia mais quem era manifestante pacífico, quem era baderneiro, quem era policial infiltrado.  A máscara mata o sujeito.
            Os discípulos de Maquiavel se arrepiariam ainda com outra falha do planejamento político do “Passe Livre” (se é que algum dia houve um planejamento político). Em julho o Rio de Janeiro se tornou palco de um evento católico de grandes proporções: a Jornada Mundial da Juventude (JMJ), que trouxe ao Brasil nada mais nada menos que o maior líder carismático dos últimos tempos, o Papa Francisco... Os maquiavélicos riem diante de tanta ingenuidade: um movimento político não pode negligenciar um dado dessa natureza...  Mentores intelectuais, quando se articulam, precisam considerar algumas agendas, e a agenda do Vaticano previa a JMJ no Brasil em julho. As mobilizações do “Passe Livre” jamais deveriam acontecer no mês anterior à visita do Papa, a não ser que isto tivesse um papel estratégico para o Movimento. Pelo que foi visto na Imprensa, a visita do Papa não tinha nada a ver com as pulsões políticas do “Passe Livre”. Manifestantes cariocas mostraram que queriam aproveitar os holofotes sobre o Rio de Janeiro (por causa do Papa e dos peregrinos da JMJ) para protestar contra Sérgio Cabral. Os maquiavélicos alertam então: Sérgio Cabral não interessa a um mundo que só está olhando para o Rio por causa do Papa. E além disso... essa imprensa internacional, que vem ao Rio por causa de Francisco, faz parte da Imprensa que foi hostilizada nas ruas durante as caminhadas de junho.
            Mil erros de estratégia. Só isso pode explicar o entorpecimento repentino do gigante. Há quem diga que ele cumpriu sua missão: o governo federal usou o movimento para pressionar o Congresso e o Senado a votarem a favor dos royalties do petróleo para a Educação. Também houve a polêmica toda envolvendo o programa “Mais Médicos”. E nesse ponto, nada me tira da cabeça que o Governo de Dilma já tinha esses planos na gaveta há um bom tempo, mas não encontrava governabilidade para levá-los adiante.  O Gigante acordado foi a chance que o Governo viu para lançar a ideia.

            Se tudo aquilo foi plano do Governo do PT, ou se foi plano de quem não tinha noção da máquina que estava acessando, não sei. O fato é que a imagem que ficou no final das contas foi a face do anonimato.